Relação entre Terapia da Fala e Freio Lingual Curto
“A Terapia da Fala só ensina a falar!” — este é, talvez, dos mitos que mais se ouve. O nome da profissão também não ajuda, uma vez que a palavra “fala” está presente.
A terapia da fala é uma especialidade de saúde que se tem tornado cada vez mais conhecida pela população em geral e que apoia desde recém-nascidos, crianças, adultos e idosos e trabalha na prevenção, avaliação e intervenção das perturbações associadas à compreensão e expressão da linguagem oral, escrita e de outras formas de comunicação não-verbais.
Podemos identificar 7 grandes áreas onde o terapeuta da fala pode intervir:
- Motricidade Orofacial – “exercício físico” dos músculos orofaciais, sempre que seja necessário estabelecer ou restabelecer as funções estomatognáticas (sucção, mastigação, deglutição, fala e respiração), como o uso excessivo da chupeta nos bebés ou a respiração oral;
- Voz – alterações vocais como rouquidão, disfonia, afonia, aperfeiçoamento ou alterações dos padrões vocais. Acontece com mau uso vocal e com prevalência em cantores, políticos e oradores;
- Deglutição – engasgamentos frequentes ou alguma dificuldade no ato de engolir e/ou mastigar. Estas alterações podem acontecer em AVC, TCE e tumores;
- Linguagem – dificuldades ao nível da expressão e compreensão na linguagem oral e/ou escrita. Estas alterações podem ter como causa perturbações auditivas ou neurobiológicas;
- Comunicação – dificuldades de interacção, verbal ou não-verbal (linguagem corporal, expressão facial). Como, por exemplo, no autismo;
- Articulação – trocas, distorções ou omissões de sons durante a fala. Esta dificuldade pode dever-se a alterações anatómicas como freio lingual curto, má oclusão dentária ou uso prolongado da chupeta;
- Fluência – dificuldade em encadear os sons da fala, como por exemplo, na gaguez ou taquifémia (ritmo da fala irregular ou excessivamente rápido).
A Terapia da Fala intervém, não só em diversas áreas, como também em várias idades, sendo que, numa delas, atua no padrão de sucção, deglutição e respiração dos recém-nascidos.
Sabia que… o freio da língua curto pode significar um problema no bebé e pode ser identificado a partir das queixas da mãe?
A língua é essencial para facilitar a sucção, pelo que o freio curto pode dificultar os movimentos da mesma. O que frequentemente se traduz no impedimento de uma pega correta do bebé durante a amamentação, causando assim dor no mamilo e aréola, inflamação e/ou mamilos gretados.
Na última década, tem havido um aumento exponencial do número de crianças com freio curto. Por esse motivo, este tema tem sido mais discutido e contribuído para mais pesquisas e mais preocupação por parte dos Terapeutas da Fala, Odontologistas Pediátricos, Pediatras e Otorrinolaringologistas. A etiologia ainda é desconhecida, mas há predomínio desta alteração no sexo masculino e quando há histórico da alteração na família. Não há ainda, no entanto, consenso sobre a sua origem e prevalência.
É normal ter freio da língua, o incomum é ter freio da língua curto, conhecido também por “Anquiloglossia”. Este freio é uma pequena estrutura de ligamento por baixo da língua que limita os movimentos da mesma, não permitindo que esta levante totalmente e toque no céu da boca ou nos dentes. Como se pode ver na imagem acima.
“Não precisa de terapia, isso com a idade passa.”
Em alguns casos, isso acontece e o paciente acaba por ultrapassar a dificuldade com a continuidade do seu desenvolvimento. No entanto, em muitos casos, esperar que isso aconteça, poderá agravar o problema.
Nem sempre ter o freio curto leva a consequências negativas para a amamentação e para a fala, não sendo, por isso, necessário corrigi-lo. Muitas destas crianças conseguem adaptar-se, mas é frequente apresentarem dificuldades não só na amamentação, como também, posteriormente, dificuldades em articular as palavras correctamente, o que leva muitas vezes a perturbações dos sons da fala, de leitura e escrita, uma vez que que as crianças tendem a escrever da mesma forma como ouvem e falam. Assim, identificado com freio lingual curto, a criança é indicada para uma intervenção cirúrgica: frenotomia. Há quem defenda uma abordagem mais conservadora, que não inclui uma cirurgia, e prefere esperar até o aparecimento de alterações na amamentação e/ou na fala. O Terapeuta da Fala avalia e diagnostica o freio lingual, podendo intervir no pré e pós-operatório com o objectivo de melhorar a mobilidade e amplitude da língua com exercícios de Motricidade Orofaciais.
REFERÊNCIAS Gomes, E., Araújo, F. B. de and Rodrigues, J. de A. (2015) ‘Freio lingual: abordagem clínica interdisciplinar da Fonoaudiologia e Odontopediatria’, Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas, 69(1), pp. 20–24. Salgado, V. R. P. (2021) ‘A anquiloglossia na amamentação uma revisão sistemática’. Available at: https://repositorio.cespu.pt/handle/20.500.11816/3732. Xavier, M. M. de A. P. C. (2014) ‘Anquiloglossia em pacientes pediatricos’, pp. 1–35.