Cuidar de Quem Cuida: A reabilitação Física após o combate aos Incêndios
Os graves incêndios florestais, que deflagraram no nosso Distrito na semana passada, não só devastaram ecossistemas, como também exigiram um esforço hercúleo dos combatentes, populares e profissionais, que arriscam as suas vidas para proteger as suas comunidades. O combate aos incêndios florestais é, como sabemos, uma tarefa árdua, extenuante e muito perigosa, que coloca as pessoas sob extrema pressão física e emocional e é, por isto, muito frequente o surgimento de lesões, patologias e disfunções físicas e mentais na sequência dos incêndios.
As lesões musculoesqueléticas devido ao esforço excessivo, tropeções e quedas, são comuns e ocorrem devido à natureza complexa do ambiente ao qual os bombeiros estãoexpostos e devido aos perigos ambientais existentes, tais como a queda de destroços, a visibilidade reduzida e a acumulação de fumo. Para além disto, a exposição ao calor extremo aumenta a probabilidade de ocorrência de queimaduras na pele e nas vias aéreas e promove também a desidratação e a fadiga aumentando a pressão sobre o sistema cardiovascular. Por outro lado, a exposição prolongada a fumos tóxicos afeta gravemente o sistema respiratório, provocando lesões agudas e agravando condições pré-existentes como a asma e a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC).
Neste sentido, no que respeita aos cuidados de saúde, a abordagem à pessoa envolvida no combate aos incêndios deve ser multidisciplinar, envolvendo cuidados médicos, de fisioterapia e apoio psicológico. Uma avaliação física, associada à realização de exames complementares caso necessário, é fundamental para identificar e tratar possíveis lesões musculoesqueléticas, da pele e das vias aéreas. Aliado a isto, e embora em alguns casos possa não existir uma lesão física, uma avaliação psicológica será também importante para identificar e ajudar a tratar traumas decorrentes dos momentos difíceis vividos durante e após o combate.
A fisioterapia, através do trabalho de mobilidade e do exercício, tem um papel importante no processo de recuperação das lesões musculoesqueléticas traumáticas decorrentes do combate aos incêndios. Para além disto, tem também um papel crucial no processo de recuperação e na melhoria da qualidade de vida dos pacientes que sofreram queimaduras graves.
Focando-nos um pouco sobre esta área específica, nos casos de queimaduras, o tratamento é estabelecido de acordo com a gravidade das lesões decorrentes da exposição, tipo e grau de comprometimento. Tendo em conta estes fatores, a intervenção do fisioterapeuta começa já na fase aguda, com foco na mobilidade, no controlo da dor e na prevenção de complicações, como contraturas, cicatrizes hipertróficas e retração dos tecidos. O objetivo é restaurar a função motora, minimizar deformidades e promover a independência funcional.
Já na fase de cicatrização, são utilizadas técnicas como exercícios terapêuticos, alongamentos musculares, mobilização dos tecidos e o uso de ortóteses para prevenir deformidades e melhorar a elasticidade e a funcionalidade da pele e dos tecidos mais profundos também afetados. Deste modo, os fisioterapeutas, em equipa multidisciplinar, ajudam a garantir que as pessoas possam recuperar um nível de qualidade de vida que lhes permita uma integração social, profissional e familiar positiva e satisfatória.
Caso tenha estado envolvido no combate aos incêndios ou tenha inalado o fumo dos mesmos e apresente queixas físicas ou respiratórias, não desvalorize os sintomas e procure ajude de um profissional de saúde qualificado.
Mito ou Verdade? “A cicatrização de queimaduras graves é lenta e pode deixar cicatrizes permanentes”
Verdade: A recuperação de queimaduras de segundo e terceiro grau pode ser longa e pode envolver tratamentos como enxertos de pele, fisioterapia e intervenções cirúrgicas.
As cicatrizes permanentes são comuns, especialmente em queimaduras de terceiro grau, devido ao dano profundo às camadas da pele.
Referências:
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