Ser cuidador: a responsabilidade de cuidar de alguém – estratégias para prevenir os efeitos da imobilidade

Ser cuidador: a responsabilidade de cuidar de alguém – estratégias para prevenir os efeitos da imobilidade

Carolina_Vieira

A síndrome de imobilidade é o conjunto de sinais e sintomas decorrentes da falta de movimento por restrição a uma poltrona ou à cama, por tempo prolongado. É associada a múltiplas causas, com implicações físicas e psicológicas e que pode levar ao óbito. Pode ocorrer de forma temporária, no caso de fraturas, cirurgias, internamentos, doenças agudas e infeções, ou prolongada, nos casos de demência, depressão grave, astenia, doenças cardiorrespiratórias, dor crónica, neoplasias, fraturas, alterações na marcha, medo de quedas, sequelas de AVC, entre outras.

As complicações da imobilidade são bastante complexas e abrangentes e podem estar presentes nos sistemas:

• Músculo-esquelético: perda de massa muscular, osteoporose, rigidez articular e muscular por falta de movimento. (1)

• Cardiovascular: aumento do ritmo cardíaco, diminuição da reserva cardíaca, hipotensão ortostática, episódios tromboembólicos venosos.

• Respiratório: atelectasias, insuficiência respiratória e pneumonias.

• Metabólico/ Endócrino: alterações nos mecanismos reguladores de glicose e colesterol no organismo.

• Génito-urinário: maior predisposição para a formação de cálculos renais, infeções do trato urinário e urosepsis.

• Gastrointestinal: perda de apetite, diminuição dos movimentos peristálticos (intestino) e consequente obstipação.

• Neurosensorial: alterações cognitivas, défice de atenção, ansiedade, depressão, alterações de humor, insónias e menor tolerância à dor.

• Dermatológico: úlceras de pressão.

Perante um caso de uma pessoa “acamada”, existem várias estratégias que podem ser usadas para prevenir o aparecimento das complicações acima mencionadas. O cuidador informal desempenha assim, um papel fundamental no tratamento e prevenção destas situações, mas este papel é, também, desafiante, podendo originar desgaste físico, emocional e económico, que se reflete na atividade laboral e nas relações sociais do cuidador. Surge, por isso, a necessidade de capacitar os cuidadores dessas mesmas estratégias para que seja possível garantir os melhores cuidados à pessoa cuidada e manter o bem-estar da pessoa que cuida.

O primeiro passo da prevenção é evitar que a pessoa fique confinada ao leito/cama ou poltrona/sofá. Sempre que possível (e seguro) deve-se estimular as caminhadas e levantes periódicos e incentivar à realização de exercícios que ponham em atividade os braços, as pernas e o tronco, diariamente.

Quando o “acamamento” é inevitável, a prevenção de complicações foca-se nas seguintes estratégias:

– Garantir as condições de higiene e cuidados básicos: espaço cómodo, arejado e sem obstáculos (móveis, tapetes); higiene corporal e oral diária e cuidado com a hidratação da pele; roupa de cama limpa, cómoda e bem esticada. A roupa do utente deve ser confortável, larga, de algodão, sem fechos e/ou botões que possam provocar desconforto; deve-se também falar/conversar, ter atenção à linguagem corporal, expressão do rosto e gestos do utente que possam indicar desconforto.

– Posicionamento: alternar entre períodos na cama e na poltrona/sofá/cadeira de rodas, tendo atenção aos pontos de pressão na posição de sentado, barriga para cima e deitado de lado (IMAGEM 1). Devem ser colocadas almofadas nos pontos de pressão e adquirir-se material adequado anti escaras (cama articulada, colchão, almofada de cadeira/cadeirão). O ideal será alternar posições de 2/2h e sempre que o utente revele algum desconforto. Se surgirem zonas de vermelhidão, bolhas, pele levantada ou feridas, deve ser pedida uma consulta de enfermagem para avaliar a situação.

– Verticalização: mesmo que não seja possível ficar em pé, é importante, passar da posição de deitado para sentado. Esta alteração da posição permite potenciar o efeito da gravidade sobre os vários sistemas do organismo e permite aliviar as zonas de pressão.

– Mobilização: é muito importante que, mesmo que o utente não o consiga fazer sozinho, o cuidador mantenha uma rotina de mobilidade diária. Esta mobilização pode ser feita de forma ativa, quando é o utente a fazer os movimentos sozinho, ativa-assistida, quando há ajuda de uma segunda pessoa para a realização dos movimentos, ou de forma passiva, quando não há colaboração do utente e os movimentos têm de ser feitos por uma segunda pessoa (cuidador, profissional de saúde).

– Acompanhamento por uma equipa multidisciplinar: por se tratar de situações com especificidade individual, todos os utentes devem ser acompanhados por uma equipa especializada em cuidados de saúde: Médicos, Enfermeiros, Nutricionistas, Psiquiatras, Psicólogos e Fisioterapeutas. A fisioterapia assume um papel de extrema importância nos casos de imobilidade, tanto no que respeita à educação, apoio e aconselhamento dos utentes e cuidadores, como na avaliação do espaço e sugestão de alterações para facilitar os cuidados. Para além disto, atua nos exercícios respiratórios e na mobilização, flexibilidade, posicionamentos e levante (quando possível). Uma avaliação feita por um fisioterapeuta, no domicílio, vai ajudar a criar estratégias e procedimentos que vão facilitar o dia a dia dos cuidadores e da pessoa dependente.

Ao cuidador:
A responsabilidade de cuidar de alguém dependente e a preocupação em oferecer os melhores cuidados podem ser tarefas complexas e desafiantes e que alteram significativamente as rotinas do cuidador. É normal que, perante este desafio, se sinta sozinho, desorientado e cansado física e emocionalmente. Por isso é igualmente importante cuidar de si: pedir e aceitar ajuda quando se sentir sobrecarregado e ou cansado; reservar algum tempo para si para praticar exercício físico ou simplesmente libertar a tensão a fazer alguma coisa de que goste; falar sobre a situação, sentimentos e preocupações com familiares/amigos/profissionais de saúde. Lembre-se que se não cuidar de si e se não estiver bem, também não consegue ajudar quem precisa.

SABIA QUE
O efeito mais evidente da imobilização é a perda de força e resistência muscular, que pode ir de 10 a 15% por semana, e 50% da capacidade muscular às 5 semanas de repouso?

Referências
Evans WJ: Skeletal muscle loss: cachexia, sarcopenia, and inactivity. The American journal of clinical nutrition 2010, 91(4):1123S-1127S. Fernandes TJ. Efeito de um programa de mobilização e exercício ativo sobre a amplitude articular em pessoas com síndrome de desuso [dissertação]. Bragança:Instituto Politécnico de Bragança, Escola Superior de Saúde, Portugal; 2015. Rousseau P: Immobility in the aged. Archives of family medicine 1993, 2(2):169. Rubenstein LZ, Josephson KR: Falls and their prevention in elderly people: what does the evidence show? The Medical clinics of North America 2006, 90(5):807-824.

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